Vida de professor da rede pública

Súplica Cearense

domingo, 15 de novembro de 2009

AO MESTRE COM CARINHO

Só para lembrar.
Ao Mestre Com Carinho (1967)

Mark Thackeray é um engenheiro negro desempregado que, enquanto não consegue um novo emprego em sua área, decide aceitar uma proposta para dar aulas numa escola secundária de Londres, no bairro operário de East End.
Ao chegar lá, lhe é dada uma classe de adolescentes que cursam o último ano e que não querem nada com a vida. Os alunos, sem exceção, são extremamente indisciplinados. Liderados por Denham, Pamela Dare e Barbara Pegg, estão determinados a destruírem Thackeray, como fizeram com seu antecessor.
Em sua primeira aula, percebe que a missão que tem pela frente não vai ser fácil de ser realizada. Entretanto, acostumado a hostilidades, principalmente por ser negro, enfrenta o desafio, mesmo com seus colegas professores não acreditando na possibilidade de qualquer êxito.
O tempo passa, sempre sofrendo a hostilidade crescente dos alunos, principalmente de Denham, não conseguindo passar a matéria prevista no currículo. Certo dia, o grupo o irrita a tal ponto que ele termina perdendo a calma, única coisa que havia jurado nunca perder. Em plena sala de aula, pega todos os livros e os joga numa lixeira, alegando serem os mesmos inúteis para aquele grupo.
Em seguida, diz aos alunos que, daquele momento em diante, vai passar a tratá-los como adultos responsáveis que, em poucas semanas, estarão deixando a escola e enfrentando o mundo que os aguarda, batalhando por uma vaga no mercado de trabalho, com todas as responsabilidades exigidas pela vida adulta.
O conteúdo das aulas passa a ser uma conversa franca entre professor e alunos sobre os mais diversos temas como, por exemplo, a vida, sobrevivência, amor, morte, sexo, casamento. Antes de mais nada, entretanto, todos vão ter que se submeter a certas formalidades que fazem parte do mundo competitivo que os aguarda, desde a forma de se tratarem entre si, com respeito, à forma de se vestirem.
A estratégia adotada por Thackeray dá certo e, em pouco tempo, ele se torna o grande líder da classe. Denham ainda tenta hostilizá-lo, mas termina se curvando diante da nova realidade.
Ao final do ano letivo, pouco antes das festividades de encerramento, Thackeray recebe uma carta que o confirma no cargo de engenheiro-assistente de uma fábrica de rádios no interior. Entretanto, após receber uma calorosa e carinhosa homenagem de seus alunos, tem dificuldades em se decidir se aceita o novo emprego ou se continua a lecionar na referida escola.

Ao Mestre com Carinho.
Quero aprender sua lição que faz tão bem pra mim
Agradecer de coração por você ser assim
Legal ter você aqui
um amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra alcançar as estrelas não vai ser fácil,
mas se eu te pedir você me ensina como descobrir qual
é o melhor caminho
Foi com você que eu aprendi a repartir tesouro
Foi com você que eu aprendi a respeitar os outros
Legal ter você aquium amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra mostrar pra você que eu não esqueço mais essa
lição
Amigo, eu ofereço essa canção
ao mestre com carinho
Foi com você que eu aprendi a repartir tesouro
Foi com você que eu aprendi a respeitar os outros
Legal ter você aqui
um amigo em que eu posso acreditar
Queria tanto te abraçar
Pra mostrar pra você que eu não esqueço mais essa
liçãoAmigo, eu ofereço essa canção
ao mestre com carinho

domingo, 8 de novembro de 2009

DESAPARECIDOS POLÍTICOS - Campanha.

O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, denominado "Memórias Reveladas", foi institucionalizado pela Casa Civil da Presidência da República e implantado no Arquivo Nacional com a finalidade de reunir informações sobre os fatos da história política recente do País.
Dando continuidade a iniciativas dos últimos governos democráticos, em novembro de 2005, o Presidente Lula assinou decreto regulamentando a transferência para o Arquivo Nacional dos acervos dos extintos Conselho de Segurança Nacional, Comissão Geral de Investigações e Serviço Nacional de Informações, até então sob custódia da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e passou à Casa Civil a coordenação do recolhimento dos arquivos.
O Centro constitui um marco na democratização do acesso à informação e se insere no contexto das comemorações dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Um pedaço de nossa história estava nos porões. O "Memórias Reveladas" coloca à disposição de todos os brasileiros os arquivos sobre o período entre as décadas de 1960 e 1980 e das lutas de resistência à ditadura militar, quando imperaram no País censura, violação dos direitos políticos, prisões, torturas e mortes. Trata-se de fazer valer o direito à verdade e à memória.
A criação do Centro suscitou, pela primeira vez, acordos de cooperação firmados entre a União, Estados e o Distrito Federal para a integração, em rede, de arquivos e instituições públicas e privadas em comunicação permanente. Até o momento, em 13 Estados e no Distrito Federal foram identificados acervos organizados em seus respectivos arquivos públicos. Digitalizados, passam a integrar a rede nacional de informações do Portal "Memórias Reveladas", sob administração do Arquivo Nacional.
Essa iniciativa inédita está possibilitando a articulação entre os entes federados com vistas a uma política de reconstituição da memória nacional do período da ditadura militar. Os acordos firmados entre a União e os Estados detentores de arquivos viabilizam o cumprimento do requisito constitucional de acesso à informação a serviço da cidadania.
Estamos abrindo as cortinas do passado, criando as condições para aprimorarmos a democratização do Estado e da sociedade. Possibilitando o acesso às informações sobre os fatos políticos do País reencontramos nossa história, formamos nossa identidade e damos mais um passo para construir a nação que sonhamos: democrática, plural, mais justa e livre.
Dilma Vana RousseffMinistra-Chefe da Casa Civil

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Homenagem

Nunca é tarde para homenagear um grande intelectual



Morre Claude Lévi-Strauss
Ele é considerado o fundador da Antropologia Estruturalista.
Entre 1935 e 1939, lecionou sociologia na USP.


Foi anunciada nesta terça-feira (3) a morte do antropólogo Claude Lévi-Strauss. A informação é da editora do intelectual, pela qual o falecimento teria ocorrido entre sábado e domingo. Criado em Paris, ele nasceu em Bruxelas em 28 de novembro de 1908. Fundador da Antropologia Estruturalista, é considerado um dos intelectuais mais relevantes do século 20.
Membro de uma família judia francesa intelectual, Lévi-Strauss estudou Direito e Filosofia na Sorbonne, em Paris. Lecionou sociologia na recém-fundada Universidade de São Paulo (USP), de 1935 a 1939, e fez várias expedições ao Brasil central.
Ali passou breves períodos entre os índios bororós, nambikwaras e tupis-kawahib, experiências que o orientaram definitivamente como profissional de antropologia.
Em 1955, publicou "Tristes Trópicos" - um registro dessas expedições. No livro, ele conta como a vocação de antropólogo nasceu durante as viagens ao interior do Brasil.
Jamais aceitou a visão histórica da civilização ocidental como única
Após retornar à França, em 1942, mudou-se para os Estados Unidos como professor visitante na New School for Social Research, de Nova York, antes de uma breve passagem pela embaixada francesa em Washington como adido cultural.
Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele"
Fez parte do círculo intelectual de Jean Paul Sartre (1905-1980), e assumiu, em 1959, o departamento de Antropologia Social no College de France, onde ficou até se aposentar, em 1982.
Lévi-Strauss passou mais da metade de sua vida estudando o comportamento dos índios americanos.
Jamais aceitou a visão histórica da civilização ocidental como única. Enfatizava que a mente selvagem é igual à civilizada.
As contribuições mais decisivas do trabalho de Lévi-Strauss podem ser resumidas em três grandes temas: a teoria das estruturas elementares do parentesco, os processos mentais do conhecimento humano e a estrutura dos mitos.
Aos 97 anos, em 2005, recebeu o 17º Prêmio Internacional Catalunha, na Espanha.
Declarou na ocasião: "Fico emocionado, porque estou na idade em que não se recebem nem se dão prêmios, pois sou muito velho para fazer parte de um corpo de jurados. Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele - isso é algo que sempre deveríamos ter presente".

Bibliografia publicada no Brasil
As Estruturas Elementares do Parentesco (Vozes, 2003)
Antropologia Estrutural (Vol. 1) (Cosac Naify, 2008)
Antropologia Estrutural (Vol. 2) (Tempo Brasileiro, 1993)
O Pensamento Selvagem (Papirus, 2005)
Sociologia e Antropologia, de Marcel Mauss (introdução de Claude Lévi-Strauss, Cosac Naify, 2003)
O Cru e o Cozido - Mitológicas (Cosac Naify, 2004)
Do Mel às Cinzas - Mitológicas (Cosac Naify, 2005)
A Origem dos Modos à Mesa - Mitológicas (Cosac Naify, 2006)
O Homem Nu - Mitológicas (Cosac Naify, 2009)




Governo Jânio Quadros

Segue abaixo, a carta renúncia de Jânio Quadros. É necessário imprimir o texto que será trabalhado em sala, na próxima aula.
Carta renúncia de Jânio Quadros
"Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções, nem rancores. Mas baldaram-se os meus esforços para conduzir esta nação, que pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, a única que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
"Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou de indivíduos, inclusive do exterior. Sinto-me, porém, esmagado. Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa de colaboração.
"Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranqüilidade, ora quebradas, indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo que não manteria a própria paz pública.
"Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes, para os operários, para a grande família do Brasil, esta página da minha vida e da vida nacional. A mim não falta a coragem da renúncia.
"Saio com um agradecimento e um apelo. O agradecimento é aos companheiros que comigo lutaram e me sustentaram dentro e fora do governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios, para todos e de todos para cada um.
"Somente assim seremos dignos deste país e do mundo. Somente assim seremos dignos de nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno agora ao meu trabalho de advogado e professor. Trabalharemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria."

Brasília, 25 de agosto de 1961.
Jânio Quadros

1. Explique as consequências das atitudes tomada por Jânio após a redação desse texto.

2. Destaque, no texto acima, um trecho que pode ser identificado ao populismo e justifique a sua resposta.

Aluno/Aluna:__________________________________________________n°______
Turma:______

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Questões sobre a década de 1960, nos vestibulares.

Questões de Vestibulares, comentadas, sobre a década de 1960

"Antes de vermos o golpe de 64 em si, é muito importante entendermos os caminhos tomados que levaram a ele, quais as conjunturas internas e externas que propiciaram a tomada do poder pelos militares. Para isso, vamos recuar um pouco na História e analisar uma série de questões a respeito do início da década de 1960 e do governo João Goulart:"
(Unesp-SP/2004) A renúncia de Jânio Quadros, em 1961, abriu um período de grande instabilidade política: havia aqueles que se opunham à posse do vice-presidente, João Goulart, e os que defendiam o cumprimento estrito da Constituição, que estipulava posse do vice em caso de renúncia ou morte do presidente.
a) Qual a saída política encontrada pelo Congresso Nacional para resolver o impasse?
b) Caracterize o governo Goulart, do ponto de vista político.

Comentários: A solução política encontrada pelo Congresso Nacional foi a adoção do sistema parlamentarista, com o objetivo de limitar o poder de João Goulart. O governo Goulart foi caracterizado por uma política de aproximação com os setores de esquerda, principalmente após o lançamento do programa das Reformas de Base. Contra essa aproximação, inúmeros setores conservadores, como as classes média e alta, parte da Igreja e das Forças Armadas, se opuseram a Jango, acusando-o de “subversivo” e de tentar implantar o comunismo no Brasil. Esses antagonismos geraram um clima de grande instabilidade política, que desembocaria no golpe de 64.

(UFF-RJ/2004) A partir de 1961, as Ligas Camponesas — formas de organização dos trabalhadores rurais — entraram em crise interna, devido a divergências entre suas lideranças. Uma defendia a adoção das teses da guerra de guerrilhas e a outra, representada por Francisco Julião e contrária a esta estratégia, tentou, sem sucesso, unificar novamente a direção do movimento. Com base nessa afirmação é possível dizer que, no decorrer dos anos 1960:
a) a organização dos movimentos sociais no campo foi aprimorada a partir da fundação de sindicatos rurais evangélicos.
b) os trabalhadores rurais brasileiros deram início a uma estratégia de ocupação em massa das grandes fazendas, por todo o Brasil.
c) os trabalhadores do campo foram vítimas do “perigo comunista”, dependendo do Golpe Militar de 1964 para libertá-los e reestruturá-los com base em acampamentos rurais;
d) os movimentos sociais no campo brasileiro passaram a ser conduzidos e orientados pela União Democrática Ruralista.
e) a organização dos trabalhadores rurais brasileiros passou a ser disputada por duas novas forças políticas: a Igreja e o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Comentários: Segundo o texto, as Ligas Camponesas, provavelmente influenciadas pelo movimento guerrilheiro da Revolução Cubana de 1959, encontravam-se divididas em 1961, com um grupo iniciando a tática de guerrilha para fazer a reforma agrária e lutar contra as injustiças dos coronéis nordestinos, e outro adotando a via pacífica, liderado pelo deputado Francisco Julião, Diante desse quadro, o movimento rural brasileiro passaria a ter novas influências em seu quadro, principalmente da igreja católica e do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Vale lembrar que o movimento das Ligas Camponesas entre 1955 e 1964 tem sido muito comparado com a atuação do Movimento Rural dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) atualmente no Brasil. Resposta correta: alternativa “E”.

(Fuvest-SP/1999) Sobre o governo de João Goulart (1961-1964), é possível afirmar que:
a) tomou medidas claras e definidas para a implantação do socialismo no Brasil.
b) propôs as chamadas “reformas de base” que pretendiam promover, entre outras, as reformas agrária e urbana.
c) fechou os olhos às lutas guerrilheiras que se implantavam em diversos pontos do Brasil.
d) foi antiimperialista, promovendo a ruptura das relações diplomáticas com os Estados Unidos.
e) tomou medidas drásticas contra os capitais externos, nacionalizando as empresas estrangeiras.

Comentários: As Reformas de Base faziam parte do plano apresentado pelo presidente Jango (Plano Trienal) que pretendia, através do corte de gastos públicos e da realização de reformas nas estruturas agrária, administrativa, bancária, tributária, eleitoral e educacional, reduzir a inflação e as desigualdades sociais.
Alternativa “B”.

(UFRN-RN/2000) Durante o governo do presidente João Goulart (1961-1964), o Estado brasileiro tentou implementar um extenso programa de reformas políticas e econômicas, conhecidas como “Reformas de Base”, as quais fracassaram devido à (ao):
a) Lei de Remessa de Lucros, que estimulou o envio de recursos financeiros de multinacionais instaladas no Brasil, às matrizes, no exterior.
b) oposição de expressivos grupos da sociedade brasileira, alarmados pela radicalização política de entidades ligadas aos trabalhadores.
c) reação ostensiva das ligas camponesas, principalmente no Sudeste, que promoveram uma campanha nacional, defendendo idéias desenvolvimentistas.
d) Plano Trienal, cujo sucesso levou importantes setores do empresariado brasileiro a considerarem inócuo o programa de reformas defendido pelo presidente da república.

Comentários: De um lado, o empresariado reclamava a queda do desenvolvimento econômico e da “postura comunista” das reformas de base. De outro, o operariado exigia agilidade nas reformas.
Resposta correta: “B”.

(Fuvest-SP/2002) “Na presidência da República, em regime que atribui ampla autoridade e poder pessoal ao chefe de governo, o Sr. João Goulart constituir-se-á, sem dúvida alguma, no mais evidente incentivo a todos aqueles que desejam ver o país mergulhado no caos, na anarquia, na luta civil.” (Manifesto dos ministros militares à Nação, em 29 de agosto de 1961).
Este Manifesto revela que os militares
a) estavam excluídos de qualquer poder no regime de democracia presidencial.
b) eram favoráveis à manutenção do regime democrático e parlamentarista.
c) justificavam uma possibilidade de intervenção armada em regime democrático.
d) apoiavam a interferência externa nas questões de política interna do país.
e) eram contrários ao regime socialista implantado pelo presidente em exercício.

Comentários: O manifesto, escrito após a renúncia de Jânio Quadros, demonstra a posição contrária dos militares em relação à posse do vice-presidente João Goulart, acusado de ser comunista.
Alternativa “C”.

(PUC-RS/1999) Ao longo dos governos Jânio Quadros e João Goulart, o Brasil buscou reorientar sua inserção internacional, pondo em prática a chamada Política Externa Independente. É correto afirmar que o objetivo norteador dessa política era
a) promover o estreitamento das relações econômicas e culturais com os países da África setentrional e do nordeste asiático.
b) estabelecer um espaço de liderança terceiro-mundista nas rodadas de negociação da Organização Mundial de Comércio.
c) acelerar o processo de negociações com a República Democrática Alemã para o desenvolvimento de um programa nuclear nacional.
d) romper a lógica de alinhamento incondicional aos EUA no contexto da Guerra Fria.
e) colocar o país na liderança militar de um sistema de defesa no Atlântico Sul, articulado à OTAN.

Comentários: Em tempos de Guerra Fria, o presidente João Goulart, em sua política externa, tentou acabar com a aproximação histórica existente entre Brasil e Estados Unidos. No entanto, essa política de independência dos EUA, reatando relações diplomáticas com a URSS, foi vista como uma aproximação com o comunismo, e esteve na base do golpe de 1964.
Alternativa “D”.

(Ufscar-SP/2000) O nome de República Populista designa o período histórico que se estende da queda de Getúlio Vargas em 1945 ao golpe militar de 1964. Alguns presidentes da República, por razões diversas, não completaram seus mandatos neste período.
a) Indique os nomes destes presidentes.
b) Em março de 1964, o presidente João Goulart participou de um comício no Rio de Janeiro com a finalidade de formalizar o início das reformas de base. Que medidas foram tomadas pelo presidente em consonância com este projeto de reformas e quais foram as suas conseqüências?

Comentários: Na resposta da alternativa “a”, você deve dizer que os presidentes que não completaram seus mandatos no período citado pela questão foram Jânio Quadros e João Goulart. Já na “b”, mais complexa, você poder dizer que as Reformas de Base previam o corte de gastos públicos e a realização da reforma agrária e estrutural de diversos setores da vida pública brasileira, como maneiras de conter a inflação e as desigualdades sociais. Tentando levar à frente o Plano Trienal, Jango, por inúmeras razões, desagradou tanto à esquerda quanto à direita, que temiam um golpe de Estado e enfraqueceu-se politicamente.

(Mack-SP/2004) A “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, em março de 1964, na cidade de São Paulo, foi:
a) uma demonstração de forças conservadoras de direita contra o que chamavam de esquerdismo e comunismo do governo João Goulart.
b) uma manifestação de apoio das famílias de trabalhadores brasileiros ao governo do presidente Goulart.
c) uma resposta das massas populares, apoiando as Reformas de Base, após o Comício na Central do Brasil (RJ/março de 1964).
d) uma demonstração de repúdio das classes trabalhadoras a uma possível intervenção militar, com apoio norte-americano, ao governo de Goulart.
e) uma manifestação, de setores conservadores da sociedade brasileira, de revolta contra a tentativa de se derrubar o governo constitucional.
Comentários: A “Marcha da Família pela Liberdade”, realizada em reposta ao Comício das Reformas na Central do Brasil (RJ), demonstrou a força da direita conservadora e contribuiu para desencadear o golpe militar que derrubou o presidente João Goulart em 1964.
Alternativa “A”.

(UFES-ES/2004) Ao assumir a presidência dos Estados Unidos, em 1961, o candidato democrata John Fitzgerald Kennedy viu-se compelido, devido à vitória da Revolução Cubana, a reforçar o sistema pan-americano de modo a preservar a hegemonia norte-americana sobre o continente e impedir o avanço do comunismo. Com esse propósito, convocou-se a Conferência Econômica e Social de Punta del Este, em agosto de 1961, ocasião em que foram fixadas diversas diretrizes, visando ao desenvolvimento da América Latina, com a previsão de um volume de investimentos externos da ordem de 20 bilhões de dólares, a serem desembolsados num prazo de dez anos. Esse projeto desenvolvimentista para a América Latina, gerenciado pelos E.U.A. e fruto da nova política externa implementada pelo governo Kennedy no contexto da Guerra Fria, ficou conhecido como:
a) Nova Fronteira.
b) Aliança para o Progresso.
c) Grande Estratégia.
d) Política da Boa Vizinhança.
e) Teoria da Contra-Insurgência.

Comentários: Objetivando conter o avanço da influência comunista na América Latina após a Revolução Cubana de 1959, os EUA tentaram se aproximar ainda mais dos países em desenvolvimento da região. Para tanto, em 1961, o presidente norte-americano John F. Kennedy criou a política da Aliança para o Progresso, que estabelecia a intensificação de investimentos financeiros norte-americanos na América Latina.
Alternativa “B”.

Depois desta batelada de exercícios sobre os antecedentes, vamos ver como os vestibulares abordaram o golpe militar de 1964. Aproveite para analisar alguns parâmetros que podem nortear seus estudos sobre a temática, principalmente a respeito das interpretações de texto e em questões conceituais como revolução, golpe ou contra-revolução para analisar o golpe de 1964.

(UFC-CE/2001) “Chefes altamente qualificados do Movimento de Março de 64 preferem chamá-lo contra-revolução. Com efeito, houve uma reação ao rumo desordenado e ameaçador das liberdades democráticas que a Nação tomava sob Goulart. (...) Março de 64 é, pois, uma resposta e não um projeto autônomo. Por isso, foi feito em nome do Anti: anticomunismo, antipeleguismo, anticorrupção”. (Jarbas Passarinho, Folha de São Paulo, 31/03/1982).
“Com efeito, o governo de Jango não caiu por seus defeitos... ele foi derrubado por suas virtudes. Essencialmente porque representava uma ameaça inadmissível para as classes dominantes. Quem viveu aqueles últimos meses de tensão recordará tanto a animosidade e o ódio que se alastraram por toda a casta de privilegiados contra o governo nacionalista e sindicalista, como o entusiástico apoio popular ao governo trabalhista e reformista”. (Darcy Ribeiro, Folha de São Paulo, 30/03/1982).
Com base nos testemunhos acima citados, faça o que é pedido abaixo.
a) Identifique os pontos de vista de cada um dos autores citados com relação ao golpe militar de 1964.
b) Compare os projetos políticos para o Brasil que estão implícitos nos dois trechos acima citados.

Comentários: Os depoimentos citados refletem divergências antagônicas em relação ao golpe de 1964. No primeiro fragmento, Jarbas Passarinho, um coronel, assume a defesa do movimento, assinalando o estabelecimento da ordem, contra o “caos” proposto pelos comunistas e outros subversivos instalados no governo, propondo-o como uma contra-revolução. Já Darcy Ribeiro, Chefe da Casa Civil do governo João Goulart, denuncia o caráter antidemocrático e de apoio às classes dominantes que o dito golpe assumiu.
Ao compararmos os projetos políticos, verifica-se que, no primeiro, o governo deveria se dedicar ao combate à corrupção, ao peleguismo e ao comunismo, assumindo uma postura de cerceamento das manifestações populares, apesar do discurso de defesa da nação. Para o segundo, o governo brasileiro pré-64 estava assumindo claramente um programa nacionalista, sindicalista, trabalhista e reformista, que ameaçava o poder das elites políticas e econômicas.

(Fatec-SP/2003) Em 31 de março de 1964, o general Mourão Filho, de Minas Gerais, iniciou um movimento de tropas em direção ao Estado da Guanabara. Em vários estados, movimentos militares eclodiram, apoiando Mourão. No dia seguinte, sem qualquer resistência do Governo de João Goulart, da população ou de militares legalistas, Jango foi deposto. A justificativa para a deposição de Jango pelos militares foi a seguinte:
a) Jango estava transformando o Brasil numa república sindicalista e comunista.
b) Jango estava realizando reformas que incomodavam os setores de exportação de mercadorias para Cuba e China.
c) Jango estava se desviando da Revolução Redentora, não querendo implantar a Reforma Agrária, aprovada pelo Congresso.
d) Jango havia realizado a reforma agrária desapropriando imensos latifúndios de empresas americanas, sem indenização alguma.
e) Jango não obedeceu a uma resolução do Supremo Tribunal Federal que regulamentava a Lei de Remessa de Lucros.
Comentários: O golpe militar de 1964 foi o resultado da crise do populismo, da conjuntura da Guerra Fria (EUA x URSS) e da polarização ideológica entre a esquerda reformista e a direita conservadora que acusava Jango de querer transformar o país numa República sindicalista de cunho comunista.
Resposta correta: “A”.

(FGV-SP/1998) Em relação ao Golpe Militar de 1964 no Brasil, pode-se dizer:
I- Foi fruto de uma conspiração civil-militar alarmada com os rumos nacionalistas do governo João Goulart.
II- Foi a forma encontrada pelos comandos militares para garantir a posse do novo presidente.
III- Representou a repulsa de setores da sociedade brasileira a tentativa de João Goulart de aumentar a presença do capital estrangeiro no país.
IV- Evitou a tentativa do Partido Comunista Brasileiro, de sindicatos de trabalhadores e de setores do Partido Trabalhista Brasileiro de exigir do presidente a implementação imediata das “reformas de base”.
Estão corretas as frases:
a) III e IV.
b) III e V.
c) I, II e III.
d) I, IV.
e) II, III e IV.
Comentários: No item II, afirma-se o contrário da intenção do golpe de 1964, que destituiu do cargo presidente João Goulart. No item III, o correto seria afirmar que o golpe representou a repulsa de setores da sociedade brasileira ao afastamento do capital estrangeiro do Brasil.
Alternativa “D”.
(UFJF-MG/2002)
"Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia (...) "
(Chico Buarque - Apesar de Você)

"Eu pisarei as ruas novamente
Do que foi Santiago ensangüentada
Numa bela praça libertada
Vou parar e chorar pelos ausentes
Vão retornar os livros, as canções
Queimadas todas por mãos assassinas
Renascerá meu povo de suas ruínas
E pagarão sua culpa os traidores. (...)"
(Pablo Milanés - Eu Pisarei as Ruas Novamente)

As letras das canções acima criticam os regimes militares instalados no Brasil (1964) e Chile (1973), respectivamente. Com base nas mesmas e em seus conhecimentos, responda ao que se pede:
a) Compare os contextos que antecederam os golpes militares em cada um dos países indicados.
b) Com base nas letras das canções, analise as relações entre governo e sociedade nos dois países, durante seus regimes militares.

Comentários: Na alternativa “A”, você deve apontar, dentre outros fatores que, em ambos os casos, havia propostas de mudanças econômicas e sociais. No caso chileno, o governo de salvador Alende da Frente Popular, eleito pelas urnas, implementou um processo de reformas que incluíam nacionalizações, como a da exploração do cobre, a estatização do sistema bancário e o desenvolvimento do processo de reforma agrária. No Brasil, o governo Goulart planejava a restrição da remessa de lucros das multinacionais, bem como as chamadas "reformas de base" – que incluíam as reformas agrária, urbana, bancária e administrativa. Contudo, estas propostas não chegaram a ser efetivadas no Brasil nas mesmas proporções do que no exemplo chileno e, em ambos os casos, os processos foram abortados pelos golpes militares.
Na alternativa “B”, tente identificar que os regimes militares em questão mantinham com a sociedade relações baseadas em elementos tais como: o autoritarismo, em suas mais diversas manifestações; o clima de medo e terror presentes na sociedade civil; a repressão política com a perseguição e assassinato de lideranças de oposição; a suspensão de direitos civis; a censura, dentre outros.

(Unicamp-SP/1996) “A palavra revolução tem sido empregada de modo a provocar confusões... No essencial, porém, há pouca confusão quanto ao seu significado central: sabe-se que a palavra se aplica para designar mudanças drásticas e violentas na estrutura da sociedade.” (Florestan Fernandes. O que é Revolução. SP: Brasiliense, 1981, p.7 e 8.)
Explique por que, segundo o conceito proposto por Florestan Fernandes, o movimento político de 1964 não foi uma revolução.

Comentários: Esta é uma questão clássica que faz com que o candidato pense em conceitos como revolução e golpe de Estado. Segundo Florestan Fernandes, os acontecimentos de 1964, por terem sido realizados por setores determinados com o intuito de conservar a manutenção da ordem, evitando alterar o status quo, distancia-se do conceito revolução; para ele, 1964 se aproximava de um golpe de Estado. Esta interpretação tornou-se bastante aceita, de modo geral, nas ciências humanas e é reproduzida na maioria das vezes, tal como estamos fazendo aqui no Zoom. Entretanto, como vimos no artigo “40 anos do golpe militar de 1964” desta edição, mesmo este conceito de golpe de Estado pode não ser suficiente para explicar o movimento militar de 1964, uma vez que restringe de alguma forma sua possibilidade de análise.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ameaça negra

Fustigando com suas ações o regime escravista, quilombolas assombravam o dia-a-dia de senhores e funcionários da colônia
João José Reis
A formação de grupos de escravos fugitivos se deu em toda parte do Novo Mundo onde houve escravidão. No Brasil, estes grupos foram chamados de quilombos ou mocambos. Alguns conseguiram reunir centenas de pessoas. O grande quilombo dos Palmares, na verdade uma federação de vários agrupamentos, tinha uma população de alguns milhares de almas, embora provavelmente não os quinze, vinte e até trinta mil habitantes que alguns contemporâneos disseram ter.
Depois de Palmares os escravos não conseguiram reproduzir no Brasil qualquer coisa próxima. Os senhores e governantes coloniais cuidariam para que o estrago não se repetisse. Foi criado o posto de capitão-do-mato (também conhecido como capitão-de-entrada-e-assalto e outros termos), instituição disseminada por toda colônia como milícia especializada na caça de escravos fugidos e na destruição de quilombos.
Assombrada com as dimensões de Palmares, a metrópole lusitana procurou combater os quilombos no nascedouro. No século XVIII quilombo já era definido como ajuntamento de cinco ou mais negros fugidos arranchados em local despovoado. Essa definição, concebida para melhor controlar as fugas, terminou por agigantar o fenômeno aos olhos de seus contemporâneos e de historiadores posteriormente. Contados a partir de cinco pessoas, o número de quilombos foi inflacionado nos documentos oficiais. Mas se, em geral, não figuravam como ameaça efetiva à escravidão, eles passariam a representar uma ameaça simbólica importante. Os quilombolas povoaram pesadelos de senhores e funcionários coloniais, além de conseguir fustigar com insistência desconcertante o regime escravista.
Para senhores e governo, o problema maior estava em que na sua maioria os quilombos não existiam isolados, perdidos no alto das serras, distantes da sociedade escravista. Embora em lugares protegidos, os quilombolas amiúde viviam próximos a engenhos, fazendas, lavras, vilas e cidades. Mantinham redes de apoio e de interesses que envolviam escravos, negros livres e mesmo brancos, de quem recebiam informações sobre movimentos de tropas e outros assuntos estratégicos. Com essa gente eles trabalhavam, se acoitavam, negociavam alimentos, armas, munições e outros produtos; com escravos e libertos podiam manter laços afetivos, de parentesco, de amizade.
É claro que houve muitos casos de quilombos isolados, às vezes encontrados por expedições que até desconheciam sua existência. Mas as evidências para o próprio Palmares, e mais ainda para os quilombos que o sucederam Brasil afora, apontam para uma relação muito mais intensa entre quilombolas e outros grupos sociais. Quilombos como os que cercavam Vila Rica (atual Ouro Preto) no século XVIII, ou o do Catucá, que se desenvolveu nos arredores de Recife e Olinda entre 1817 e 1840, aqueles instalados em redor de Salvador e de São Paulo nas primeiras décadas do século XIX, o quilombo do Piolho nas vizinhanças de Cuiabá, na década de 1860, os fluminenses da bacia do Iguaçu e da periferia da Corte, assim como os da periferia de Porto Alegre, ao longo do século XIX, todos mantinham redes de comércio, relações de trabalho, de amizades, parentesco, envolvendo escravos, negros livres e libertos, comerciantes mestiços e brancos. A essa complexa trama de relações Flavio Gomes chamou de “campo negro”, um espaço social, econômico e geográfico através do qual circulavam os quilombolas, que incluía senzalas, tavernas, roças, plantações, caminhos fluviais e pântanos, alcançando vilas de pequeno porte e cidades do porte do Rio de Janeiro, quando já era a mais populosa do Brasil em meados do século XIX.
Essas relações de alto risco atormentavam senhores e governantes coloniais e imperiais. Os amocambados também assaltavam viajantes nas estradas, às vezes tornando-as intransitáveis, e atacavam povoados e fazendas, onde roubavam dinheiro e outros bens, recrutavam ou seqüestravam escravos. Mas além de assaltar, roubar e seqüestrar, eles também plantavam, colhiam, caçavam, constituíam família.
São numerosos os relatos que dão conta da destruição de roças de milho, frutas, algodão, cana e outros produtos cultivados pelos quilombolas. Cultivavam, sobretudo, a mandioca, com que faziam farinha eles próprios. Quando atacados, as roças eram arrasadas para “não tornarem a servir de Criminozo azilo”, como escreveu o capitão-mor que destruiu os quilombos do Orobó e Andaraí na Bahia, em 1796.
Nas áreas de mineração os fugitivos se dedicavam à prospecção de pedras e metais preciosos, que trocavam clandestinamente com taverneiros por produtos necessários à sua sobrevivência, além de armas e munição. Em alguns casos conseguiam o suficiente para comprar a alforria, passando de negros fugidos a negros libertos.
Segundo a historiadora norte-americana Mary Karasch, os quilombolas de Goiás descobriram numerosas lavras auríferas, que eram posteriormente apropriadas pelos caçadores de escravos. A caça ao quilombola e a procura do ouro caminhavam juntas nas expedições feitas ao interior. A entrada realizada em 1769, a partir de Minas Gerais, pelo mestre-de-campo Inácio Correia Pamplona, foi saudada por um sertanejo versejador, que entre loas ao comandante arrematava:
Tudo feito nesta maneira
pólvora, chumbo e patrona,
espingardas à bandoleira,
entrando duas bandeiras
Procurando Negros e ouro,
Deus nos depare um tesouro
para garrochiar neste touro.
O historiador e etnólogo Edison Carneiro, a propósito, escreveu que “o quilombo [...] serviu ao desbravamento das florestas além da zona de penetração dos brancos e à descoberta de novas fontes de riquezas”.
No Rio de Janeiro oitocentista, os quilombolas de Iguaçu mantinham intenso comércio de madeiras com a Corte e também se empregavam nas fazendas de proprietários que sabiam estar contratando negros fugidos. No Maranhão, em 1867, um juiz de direito denunciava “A ambição desregrada de certos indivíduos, ambição que os leva a seduzir escravos para fugir, tendo em vista tirar vantagens com as colheitas destes, que as vendem por módicos preços”. Esta era, aliás, uma prática comum. Os donos de escravos frequentemente publicavam anúncios em jornais ameaçando de processo e exigindo indenização dos coiteiros. No sul da Bahia, na vila de Barra do Rio de Contas (atual Itacaré), em 1806, dezenas de escravos se aquilombaram numa comunidade de lavradores que os empregavam no cultivo da mandioca. Quando este quilombo, chamado Oitizeiro, foi disperso, descobriu-se que os próprios escravos dos lavradores eram prósperos produtores de mandioca e ativos coiteiros de calhambolas.
Fonte: Revista de História da Biblioteca Nacional.
Custo Brasil
Desde as invasões holandesas estava evidente: a colônia americana só era viável com o braço escravo angolano. Crescemos à custa da miséria africana.
Luiz Felipe de Alencastro
No Atlântico português formou-se uma matriz espacial colonial específica. De um lado, no litoral da América do Sul, desenvolveram-se uma economia e uma sociedade fundadas no trabalho escravo africano. Do outro, principalmente em Angola, mas também no Golfo de Guiné, situavam-se as redes de reprodução dessa mão-de-obra escrava. As duas margens do Atlântico Sul se completavam em um só sistema de exploração colonial, cuja singularidade ainda marca profundamente o Brasil contemporâneo.
No início do século XVII, a circulação de homens e mercadorias entre Brasil e Angola já era considerável. Uma das mais claras demonstrações da ligação entre as duas colônias aparece no encadeamento das invasões holandesas. Na estratégia holandesa, os portos comerciais dos dois lados do Atlântico Sul eram alvos conjugados.
Quando tomaram a Bahia, em 1624-5, os holandeses promoveram também o bloqueio naval de Benguela e Luanda. A segunda campanha atingiu o alvo em 1630, com a captura de Olinda e Recife. Cinco anos depois, a Zona da Mata pernambucana tinha caído sob o controle de Maurício de Nassau. No primeiro relatório que envia a Amsterdã, ele enuncia as regras do jogo colonial no Atlântico Sul. Adverte que não era qualquer um que servia para ser colono na Nova Holanda: os candidatos deveriam dispor de capital “para mandar fazer a fábrica de que precisam, pois não podem ser trazidas da Holanda como são aqui necessárias, e para comprar alguns negros, sem os quais nada de proveitoso se pode fazer no Brasil”. E insiste: “Necessariamente deve haver escravos no Brasil (...) é muito preciso que todos os meios apropriados se empreguem no respectivo tráfico na Costa da África”.
Admitida a necessidade do tráfico negreiro, faltava ainda montar o circuito transatlântico de compra, transporte e venda dos africanos. Em 1637, Nassau envia uma frota do Recife para capturar São Jorge da Mina, entreposto português de comércio de ouro e de escravos no litoral africano (atual Gana). Sem saberem ainda negociar escravos na África, os holandeses levam dois intermediários para tratar com os traficantes africanos. Mas, ao constatar que a região não era suficiente para dar conta do fornecimento de escravos a Pernambuco, Nassau lança seus navios sobre o maior mercado atlântico de cativos: Angola.
Luanda, Benguela e São Tomé caem nas mãos dos holandeses entre agosto e novembro de 1641. A captura dos dois pólos da economia de plantações – as zonas produtoras escravistas americanas e as zonas africanas reprodutoras de escravos – mostrava-se indispensável para o implemento da atividade açucareira. Nassau é enfático: sem o trato negreiro e os portos angolanos, o Brasil holandês seria “inútil e sem frutos para a Compagnie”.
Pelos mesmos motivos, Portugal se preocupava com a situação na América. Chegou a tentar um acordo com os holandeses para que as duas partes tivessem acesso ao comércio de escravos. Não teve sucesso, e em meados de 1643, Telles da Silva, governador-geral do Brasil, prevenia el-rei: “Angola, senhor, está de todo perdida, e sem ela não tem Vossa Majestade o Brasil, porque desanimados os moradores de não terem escravos para os engenhos, os desfabricarão e virão a perder as alfândegas de Vossa Majestade os direitos que tinham em seus açúcares”. Ou seja: sem o trato de Luanda, a colônia americana estava condenada. Diferentemente do que tem sido dito e escrito em boa parte da historiografia brasileira, o tráfico de escravos no Atlântico Sul era predominantemente bilateral, e não triangular.
Tropas, navios e munição em quantidades suficientes para o socorro da África Central não poderiam sair de Portugal, que continuava em guerra de fronteira com a Espanha e guerra marítima com a Holanda. Coube então ao Rio de Janeiro e às capitanias adjacentes – principais interessadas no restabelecimento do tráfico negreiro – a tarefa de fornecer gente e petrechos, “pois todo o Brasil necessita de escravos para seu remédio”. Por força das circunstâncias que coibiam a ação da metrópole, abriu-se espaço para uma co-gestão lusitana e “brasílica” (nome genérico para os colonos do Brasil) no Atlântico Sul.
É Salvador Correia de Sá e Benevides (1602-1688) quem conduz, em maio de 1648, a frota luso-brasílica que reconquistará Angola. Composta de onze naus e quatro patachos, com quase dois mil homens, a expedição é financiada em 70% por fundos coletados junto aos negreiros e fazendeiros fluminenses. Dispondo de um estado-maior experimentado no Atlântico Sul e de “boa gente e infantaria exercitada nas fronteiras nas guerras de Portugal e na campanha de Pernambuco”, o corpo expedicionário desembarca e, após combates em Luanda, vence os holandeses em agosto de 1648.
Num memorial enviado à Corte, a Câmara de Luanda reconhece explicitamente que os sucessos da reconquista de Angola “mal se lograriam se os moradores daquela ilustre cidade [o Rio de Janeiro] se não fintaram [tributassem] com uma muito grande soma de dinheiro com que a armada se forneceu e obrou o fim desejado”. Cinco anos mais tarde, a Câmara do Rio de Janeiro reivindicou orgulhosamente o mérito da expedição: “Quem pode negar a esta cidade a glória da restauração de Angola?” A história da expulsão dos holandeses deixou evidente que o Brasil tinha continuidade fora das fronteiras americanas.
A partir daí, a presença brasílica afirma-se na África Central. Depois da independência, Angola continua sob influência brasileira, e desde 1823 fala-se da presença em Luanda, e sobretudo em Benguela, de um “partido brasileiro”, que joga as cartas dos interesses negreiros dos escravistas do Império do Brasil contra a política colonial portuguesa. Do lado brasileiro também havia um “partido angolano”, que almejava anexar Angola ao Brasil. Esta estratégia anexionista foi claramente enunciada por Nicolau Pereira de Campos Vergueiro (1778-1859), pai da pátria, senador, regente do Trono e ministro, na Constituinte de 1823.
Nenhuma região escravista das Américas teve na África um peso similar ao do Brasil. A intervenção brasileira em Angola, como também no Golfo de Guiné, sobretudo no antigo reino do Daomé, só declina após 1850, com o fim do tráfico negreiro no Atlântico Sul. Concretamente, o ciclo mais longo da economia brasileira é o ciclo negreiro que vai de 1550 a 1850. Todos os outros – do açúcar, do tabaco, do ouro e do café – são, na realidade, subciclos dependentes do ciclo negreiro. Neste sentido, pode-se dizer que a construção do Brasil se fez à custa da destruição de Angola.
A dependência do tráfico negreiro e da escravidão também deixou efeitos perversos entre nós. O fato de pilhar durante três séculos a mão-de-obra das aldeias africanas facilitou o extermínio das aldeias indígenas, tornadas desnecessárias, e gerou entre os senhores de engenho, os fazendeiros e o próprio governo, uma brutalidade e um descompromisso social e político que até hoje caracterizam as classes dominantes brasileiras.
Luiz Felipe de Alencastro é professor titular da cátedra de História do Brasil da Universidade de Paris IV Sorbonne e autor de O trato dos viventes – formação do Brasil no Atlântico Sul, séculos XVI e XVII (São Paulo: Companhia das Letras, 2000).
Saiba Mais - Bibliografia:
BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti (orgs). História da expansão portuguesa. vol 1. Lisboa: Círculo dos leitores, 1998.
BOXER, Charles Ralph. O império colonial português (1415-1825). São Paulo: Companhia das Letras, 2002
THORNTON, John, A África e os Africanos na formação do mundo Atlântico,1400-1800 . Rio de Janeiro, editora Campus, 2004.
Fonte: http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=2125